18 novembro 2006

Uma nova tempestade

Uma nova tempestade parece se aproximar... uma chuva quente, intensa, dessas que acalmam o calor e acendem nossos corpos.
Isso parece me lembrar há quanto tempo não tomo chuva, há quanto tempo não me permito, não me entrego ao prazer da entrega.
É como se tivesse me fechado, me trancado numa torre alta de tanto medo de perder, de ser de novo traída, abandonada. Junto com minha alma anestesiei meu corpo, incapaz de sentir, de abraçar, o olhar sempre distante, o gozo que agora me parece ridículo, tão longe ficou no tempo.
Muito pouco sobrou do que me era mais caro, e me tornei amarga, preconceituosa, arrogante. Ás vezes me assusto ao perceber minha voz tão pronta pra reclamar e tão cega pra me alegrar com a beleza da vida.
Há tanta beleza nesse mundo.
A redoma blindada que coloquei em volta do que há de melhor em mim sufoca mais do que protege.

Reencontrei um livro de poesias em minha gaveta. Aquelas palavras que descreviam tão claramente o meu amor, o meu gozo e o meu corpo convulso vieram como um martelo de encontro à redoma. Algo se rachou dentro de mim e chorei com um desespero que há muito não sentia. Um grito mudo me tomou e então eu vi (não sem dor) que havia algo de podre nessa redoma. Dormi ainda com o rosto molhado.
Quando acordei me senti como se estivesse inteira quebrada, e de certa forma estava.
No reencontro, não estava lá. Minha boca falava e meu ouvido ouvia minha própria voz como se fossem coisas distintas.
Eu não estava lá, raramente estou.
Eu não estava inteira, raramente estou.
Mas havia uma rachadura, e ela foi tocada. Não falávamos de amor, mas era no amor que minha alma pensava. Minhas lágrimas foram de emoção sincera, mas não se referiam ao que eu falava. Se referiam ao amor, à saudade, ao medo de amar.
E então fiz um comentário simples, algo sobre algumas mulheres que são especiais e os olhos dele se acenderam. Seu rosto abaixou levemente e quase pude sentir o tremor do seu corpo. Isso me fez lembrar o quanto as pessoas apaixonadas podem ser profundamente encantadoras.
Que fique claro, a paixão não é por mim e o reencontro não se referia a amor
.
Mas me lembrou de como o ENCONTRO entre duas pessoas pode ser algo bom, me lembrou que o mundo é muito maior do que o mundinho em que vivo e me lembrou que não foi por amor que sofri.
O amor só me fez feliz. O que me fez sofrer foi ter colocado toda a minha felicidade nas mãos de quem não conseguia sustentar nem a própria. O que me fez sofrer foi o ciúme, o medo, o jogo cruel em que nos envolvemos. Foram as agressões, e não o carinho. Foram as noites em que violentei o meu corpo e não as noites em que nos entregamos a uma dança primitiva, a um ritual de prazeres.

Esse breve acender de olhos me iluminou por dentro e provocou outra rachadura. Por essa não chorei, pelo contrário, estive feliz como há tempos não estive. Senti uma energia gigantesca me inundar e me dizer que a vida segue, que o mundo é grande, e que eu ainda sou capaz de sentir. Me senti viva de novo.

Sei que em breve voltarei ao meu estado antigo. Minha voz ainda está pronta a reclamar e meu peito se inclina à tristeza da mesma forma que me inclino ao precipício. Mas agora existe uma rachadura, uma pequena e suave esperança.